A QUEM TEM FOME
João, filho de Ninguém,
ficava de prontidão
pra pedir qualquer vintém,
migalhas pr'um cidadão.
Comida aos quem têm fome.
Bendito seja o teu nome!
Não tinha tempo ruim,
fosse dia, fosse noite.
Rezava pro querubim,
para evitar o açoite.
Comida aos quem têm fome.
Bendito seja o teu nome!
Com a barriga vazia,
sentado numa calçada,
era lixo o que engolia,
rápido, numa bocada.
Comida aos quem têm fome.
Bendito seja o teu nome!
De fraqueza, ali ficava,
ao relento e sem afeto.
No jornal, ele deitava,
encolhido e muito quieto.
Comida aos quem têm fome.
Bendito seja o teu nome!
Mas o frio e o medo
vinham certo e o castigavam.
Cola e pedra, já bem cedo,
seus “manos” lhe entregavam.
Comida aos quem têm fome.
Bendito seja o teu nome!
Dessa forma, entorpecido,
desafiava o perigo.
Pobre menino esquecido,
de cabelo cor de trigo.
Comida aos quem têm fome.
Bendito seja o teu nome!
Era assim a sua vida:
às vezes, era bandido,
muita carteira batida,
de qualquer bolso fedido.
Comida aos quem têm fome.
Bendito seja o teu nome!
Outros dias, era anjo
que, por migalhas de amor,
fazia qualquer arranjo
para espantar sua dor.
Comida aos quem têm fome.
Bendito seja o teu nome!
De repente, na zoiera,
encontrou bala perdida.
Ficou sem eira nem beira,
tombou a alma ferida.
Comida aos quem têm fome
Bendito seja o teu nome
Exposta a nossa prole
às garras do predador,
seu sangue toma num gole,
deixando à flor o horror.
Salvem teus frutos benditos
da ganância dos malditos.
Por Luzia M. Cardoso
Poema em Trovas, no estilo medieval.
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