No Bico do Pato
Eu vou contar a história
Do pato que se criou
Junto ao povo d’um país
Que um outro arrematou.
Nasceu lá no Tietê,
Por outros cantos andou.
Um dia, todos viram
Inflado pato amarelo.
Amarelo como ouro
À porta de seu castelo.
Inchado de muito ar,
Pôs o povo no chinelo.
E o pato fez a fama,
Teve muitos seguidores:
Batedores de panelas,
Automóveis e tratores.
Teve lemas e bandeiras
E declarações de amores.
Teve pato em toda a orla.
Teve pato indo às ruas,
Teve pato pelas praças,
Teve pato sob luas...
O pato cumpria ordens.
Ordens duras, cruas, nuas.
Pelo pato se odiou.
Pelo pato ofenderam.
Pelo pato ultrajante,
Tiraram quem elegeram.
Adoradores de pato,
Aos seus pés se renderam.
A miséria aumentou,
O país andou pra trás.
Assaltos todos os dias,
Por ladrões e serviçais.
Inflação descontrolada,
Desemprego e muito mais.
Recuaram tantos anos,
Que chegaram à inquisição.
Acreditando em bruxas,
Mandingas, superstição...
Armaram a fogueira
Pra queimar oposição.
Dois anos já se passaram
E o povo não aprendeu.
Repetindo a história,
O mundo surpreendeu.
Foi miséria e inglória
Que, ao povo, o pato deu.
E o povo, subalterno,
Fica a olhar o chão.
O chão por ele aplainado,
Plantado por sua mão.
O chão, esteira da fábrica
Para o bolso do patrão.
E o povo enganado,
Na labuta intermitente,
Na jornada alongada,
No direito inexistente,
Troca seu tempo e seu sangue
Por vida de indigente.
Enquanto o povo padece,
Parasitas tudo invadem
E quem tem, busca ter mais.
Aos de fora, o que pedem.
Especulam com o produto
E em nada mais investem.
Milionários travam ruas
Quando são contrariados.
Não querem pagar impostos,
Não querem ser controlados.
“Liberdade pro mercado!”
É um de seus postulados.
Põem preço na Saúde
E, também, na Educação,
Dificultando o acesso
De quem produz todo o pão.
Vendendo a ideia do mérito,
Aumentam a exploração.
O povo vê pelos ares
Tudo por que se lutou.
Os direitos conquistados,
O golpe já derrubou
E o Estado democrático,
Logo se tiranizou.
Mas o povo se ilude,
Enaltece os d’outra classe.
Fica aflito ao espelho
E, diante do impasse,
Mostra defeitos nos seus,
Como se se elevasse.
Crê que o trabalhador
No poder vira ladrão.
Por isso, deixa ao rico
A direção da nação.
E a média quer os padrinhos
Para beijar-lhes a mão.
Foi lá, na terra brasílis
Que o pato apareceu,
Onde manda o tucano,
Que repete o que aprendeu
Com a ave de rapina,
Para quem tudo cedeu.
Luzia M. Cardoso
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