Aos cuidados da Orixá
(homenagem póstuma)
Praia da Guanabara - Freguesia, Ilha do Governador
RJ, 17 de outubro de 2010)
Sinto impressos em teus
olhos,
O horizonte, o céu e o
mar...
Ao longe, barcos a
velejar
As aves observando
Os teus passos, os teus
rumos
Sob o sol
Sob o céu
Árido asfalto
Teus pés na areia
Tocam nas águas de
Iemanjá
Riachos rolaram no olhar
Tua face rasgando
O sal e as ondas do mar
Eu vi teu tempo
escorregar...
Em tantas noites sem
luar,
Estrelas que se apagaram
Caminhos que se
fecharam...
Um breu profundo se
abriu.
Vento cortante
Sempre por lá.
E se fez de firme
Se fez de forte
Em algum desses bancos
A esperar,
Marolar, marolar,
marolar...
Quatro paredes
Quarto e sala... Uma
ilha
Sonhos envelheceram em
solidão
Cada dia pesou mais a
mão
Já são três anos de
saudades.
Seguem passos na calçada...
Nós duas, tuas irmãs,
Eu e Luci à beira mar
Meu olhar no horizonte.
Ouço o canto do mar,
O silêncio dos pássaros
E dos barcos atracados...
Tantas redes emaranhadas
Numa pedra está fincada
A capelinha de Iemanjá
Da caixa de papelão,
De um pequeno saco plástico
Retiramos as tuas cinzas
Entregando o que deixou
Aos cuidados da Orixá,
Nesse dia dezessete,
Outubro de primavera,
Pedras brincam de me molhar...
Uma brisa nos envolve
Num abraço fraternal,
Eu, você e Luci.
Neste dia, aqui estamos,
Num oceano de saudades...
Talvez haja um porto na eternidade.
Com o meu carinho,
Luzia M. Cardoso
Rio de Janeiro, 17 outubro de 2024